quarta-feira, agosto 05, 2009

Sines com a família do mundo na barriga

O Festival Músicas do Mundo (FMM) de Sines atrai anualmente largos milhares de visitantes de todo o mundo. Grande parte deles viaja de caravana, que estaciona onde há espaço. Sentem-se, garantem, “uma enorme família unida pela música do mundo”.

Na linha da costa junto ao porto de recreio de Sines, há dezenas de caravanas ilegalmente estacionadas num parque de terra batida. De portas abertas, com gente a entrar e a sair, convidam à conversa e à festa.

[fotografia de Vítor Martinho]
Lá dentro, e a toda a volta, há festivaleiros de diferentes países, entre o sol de fim de tarde, comida, bebida e música tocada de improviso, a fazer tempo até à hora de início dos concertos umas ruas acima, no histórico castelo.

Richard Sneelling, holandês de 55 anos, pela quinta vez em Sines para assistir ao FMM, vem para “ouvir artistas de muita qualidade que fazem uma música ecléctica, genuína, plural e demarcada dos sistemas comerciais, num ambiente descontraído e amigável”.

“Há sempre grandes surpresas na escolha dos grupos e parece que cada vez é melhor”, diz.


Tineke e Don Mun Smith, também holandeses e fãs do festival, “fazem da caravana casa durante esta semana” e garantem que “ninguém faz caso de que o local onde estacionaram não seja exactamente autorizado”: “faz parte de ser português ser descontraído, também adoramos isso”, sorriem.

“E é um festival que democratiza a música: é barato, todos podem chegar-lhe”, acrescentam.

Da mesa a que se sentam os três holandeses saíram há pouco Sónia e Nuno Marques e Rui Simões, “acabados de assentar arraiais, vindos de Carnaxide”, arredores de Lisboa.

“Ouvimos o Tineke tocar acordeão e não resistimos. Agarrei no djambé e juntei-me a ele. É isto o festival, esta fusão, esta energia positiva, este sentimento de comunidade”, explica Nuno.

[fotografia de Vítor Martinho]

A mesa volta a encher-se com os bhaji de cebola que John Vendi, inglês, vem vender por um euro.

“É um petisco tradicional do Paquistão. A minha mulher é paquistanesa, cozinha-os e eu vendo-os. Somos conhecidos em muitos festivais”, garante. A mesa confirma o talento apregoado.

“A música é a primeira ligação entre as pessoas, o resto vamos fazendo a cada minuto, com os vizinhos das outras caravanas, com as pessoas na rua ou no mercado”, considera John.
[fotografia de Vítor Martinho]
Entre a caravana destes três holandeses e a dos seus vizinhos ingleses está uma corda de roupa “da qual se serve quem tiver roupa molhada, porque ela não é propriedade exclusiva de ninguém”.

A família que decide, para esta entrevista, chamar-se Gonzalez tem oito elementos – fora os cães, que ninguém arrisca contar –, dos dois aos 60 anos e está instalada num atrelado que foi inicialmente concebido para transportar cavalos.

O ancião da família reconhece que se apercebeu de que não era “muito legal estacionar aqui”, mas “presumiu que, sendo o espaço perto da polícia, toda a família estaria segura”.

[fotografia de Vítor Martinho]
“Somos muito lavadinhos e repartimos com todos a droga que trouxemos. Não haverá azar”, garante.

“É maravilhoso o espírito de comunidade. Há pouco alguém deu almoço ao meu neto e veio agradecer-me por ter podido brincar com ele um par de horas”, conta. “Sinto-me em casa”.

O inglês dos pés sujos, cuja língua tropeça no álcool e enrola a fala, conta, sentado num sofá vermelho roto e encardido, que “houve um ano em que a polícia veio pedir para que se desmontassem as tendas mas quando percebeu o trabalho que ia dar desistiu e juntou-se à festa”.

Com o somar das horas chegam mais festivaleiros e o cenário multiplica-se pela extensão do parque de terra batida que está cada vez mais cheio.

Em cima, no Castelo, Sines, com cada vez mais mundo na barriga, não deixa a música parar.

3 comentários:

solta disse...

Também andei por lá! A fazer crescer um pouco mais essa barriga de música e sorrisos. E como tenho na bagagem já muitos anos para comparar, posso dizer que este 2009foi dos melhores FMM!

Agora é só esperar por 2010 para superar ...

LiMpA_ViAs disse...

Óptimo de ler este post!

beijinho oh jornalista;)*

Cátia disse...

Só boas energias :)
Lindas as fotografias!
E olha criei um espacinho meu pra ir partilhando algumas coisas..
Beijo grande*