segunda-feira, agosto 17, 2009

A lady bardajona

Mimi tinha o nome de um Portugal salazarento que não lhe servia. Nunca o dizia a ninguém. Às vezes em surdina, aos mais chegados, Clotilde.

E era uma lady. Matrafona mas cintilante, com cabelo de macho mas de tornozelo fino e de unha irrepreensivelmente pintada.

Mimi era também bardajona e obscena. Nunca usava cuecas porque, advogava, “era uma caloreira desgraçada”, mesmo no Inverno.

Tinha um casamento destroçado e um marido a condizer. “Um-banana-que-p’r’áli-andava”, pai de duas filhas que ela fizera “praticamente sozinha” e tão dócil que “nem se atrevia a comentar“ a roda viva de adultério que era a vida de Mimi.

Mimi era, já se percebeu, uma mulher de fala rija e franca.
E de gestos conformes.

Era cozinheira num restaurante de bairro e fazia pénis com todos os alimentos que lhe passavam pela mão, se a travessa fosse para servir a homens. Fez corar largas dezenas deles.

Mimi fazia-os presas. Devorava-os. Ela mandava sempre. Não houve nenhum homem a resistir-lhe.

Resistiu-lhe Portugal, que lhe chamava nomes feios por ser assim das palavras e dos gestos.

Foi para a “América da liberdade”, porque ali pode dizer palavrões barbudos e ser uma lady ao mesmo tempo. E sobretudo, claro, porque “há muito mais homem para ver”.

1 comentário:

david disse...

Não sei onde enquadrar esta tua - e como bem lhe chamas - "estória". Chamo-lhe crónica, daquelas que nos deixam presos às letras, com vontade de ler MUITO mais sobre a lady Mimi.

Gostei.



David