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quarta-feira, março 03, 2010

A alma e o cu na bandeira basca


Em cima da mesa onde esteve um jantar tradicional basco estão agora pousadas duas mãos que a terra enrudeceu. Entre os dedos grossos, gretados, encardidos, está sempre um cigarro.

Este homem tem mais de 50 anos. Nasceu numa rua “ali ao fundo”, no centro histórico de Hernani, baluarte nacionalista basco com 20 mil habitantes, perto de San Sebastien, – Donostia em euskadi, língua basca – na província de Guipuzcoa.

Estes olhos azuis com rugas tingidas de sol foram parte da luta pela independência que Madrid estanca sem ceder. Agora apenas olham, atentos, as brincadeiras da sua filha e o recorte verde das alfaces que as mãos pesadas plantam e colhem.

“A luta política armada é absurda. Os etarras são os primeiros a não compreender a liberdade. Estás num bar, dizes uma coisa que não lhes interessa, que os desagrada, levas um tiro no cachaço”, defende, gestos teatrais, exagerados; a arma imaginária na sua nuca, e a onomatopeia – pááá, pááá, o som da bala – muito repetida.

Não foi à manifestação que ao cair da noite gelou as ruas do centro histórico com uivos tensos de revolta, frases de ordem e punhos em riste, exigindo a libertação dos presos políticos da terra.

“Estás num bar, dizes uma coisa que não lhes interessa, que os desagrada, levas um tiro no cachaço”, relembra, no espaço de minutos. E a arma imaginária de novo na sua nuca, a mesma onomatopeia – pááá, pááá, o som da bala – a ecoar.

“Há uma manifestação por cada preso. Não me parece que valha a pena ir. Sou nacionalista mas a política não me interessa absolutamente nada”.

A sua ideia está apenas posta naqueles cabelos loiros e naquele recorte verde, reitera. É agricultor. A luta é todos os dias, na horta, para poder comer e beber. O nacionalismo independentista, diz, tem todos os argumentos e merece todo o seu respeito.

Conta com a sua alma e, na verdade, com parte do seu corpo.
“Acredito na independência do meu país. Não somos França nem Espanha, somos bascos. Mas se estou no meio da rua, se me dá vontade, se não tenho outra opção, se cago, se não tenho mais nada, se está uma bandeira à mão – a minha bandeira – agarro-a e limpo o cu com ela”.