As cerca de 60 famílias de militantes do MST estão acampadas no chão vermelho da berma de uma estrada que conduz ao Pantanal há mais de seis meses. Todas têm casa a poucos quilómetros, nas cidades de Corumbá e de Ladário. Há tendas improvisadas com troncos finos e lençóis de plástico preto grosso e duas bandeiras hasteadas: a do Brasil e a das ideias.
Há jerricãs, cavalos, cães e galinhas. Há militantes de pele morena e chinelos nos pés, uns a trabalhar, outros à sombra, a conversar e a beber tereré [uma bebida de origem guarani, feita com a imersão da erva-mate].
Miriam e Anderson são coordenadores do acampamento. A mulher explica que “até chegarem onde querem chegar, as famílias [aqui representadas] têm que passar por um processo doloroso, longo, por muitas dificuldades”.
O homem – rapaz, ainda – fala pouco, mas ela fala por ele: “Tenho sete filhos, nenhum deles aqui comigo. Deixei a minha família para estar aqui. Esta é minha nova casa. Não temos crianças na comunidade porque ainda não conseguimos organizar-nos para que os meninos possam ter aulas”, explica.
São eles a voz desta “família grande que se juntou na luta”. Têm a tarefa de dialogar com a autarquia e com outras entidades para conseguirem benefícios para a comunidade. São eles que vão articular-se com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária até que se encontrem na região fazendas que possam ser desapropriadas e divididas em parcelas de terreno, que serão distribuídas pelos militantes e depois cultivadas. O processo pode demorar entre um e cinco anos.
Pelas contas do MST, existem pelas bermas das estradas do Brasil 90 mil comunidades com esta.
A coordenadora explica ainda que “há alguns militantes que trabalham na cidade e só vêm ao acampamento quando têm folga e outros, como é o seu caso, que permanecem e vivem com a cesta básica de alimentos que o Governo dá”.
Estar aqui, diz, “é maravilhoso, os dias são gostosos”, e é imprescindível: “Tem que ficar aqui, não tem que abandonar, tem que correr atrás até conseguir. Esse é o objetivo”, acrescenta.
Sentado num banco baixo, sem costas, Elisiomar Rodrigues da Silva conta que nasceu e cresceu numa fazenda: “Vim para aqui por causa da falta de emprego na. As máquinas estão a tomar o nosso espaço na fazenda, a empurrar-nos para a cidade”, diz. Tem cinco filhos entre os nove e dois anos. A família não está no acampamento e Elisiomar sente saudades mas está certo de que se não for ele a lutar pelos filhos, não há quem lute.
Quando tiver um pedaço de terra vai “plantar uma mandioca, um milho, um feijão, que é a comida do pobre. Mas sem depender de patrões porque só nos querem enquanto temos saúde. Quando se perde saúde deixa-se de se ser bom”.
No acampamento, garantem, “é tudo gente humilde”, que precisa de terra, que quer trabalhá-la.