A KöpenickerStrasse – a caminho da famosa Fernsehturm Berlin, a torre da televisão – vem descendo gorda de gente, que desfila enquadrada por uma atenta, embora desinteressada, escolta policial.
A música chega ainda antes da multidão, como chegam as garrafas de cerveja vazias que caem de algumas mãos da amálgama dançante que aí vem, arrumada entre carrinhas de caixa aberta e olhada de cima para baixo por uma densa nuvem de fumo de tabaco e marijuana.
O som cresce e a parada ganha cada vez mais forma.
O som cresce e a parada ganha cada vez mais forma.
- “É a Fuck Parade”, responde um guarda a olhos curiosos que o abordam.
Hexac Hexe é uma berlinense loira alta e magra, de olhos claros. Os trapos que lhe cobrem o corpo tampam as vergonhas e sobram para pouco mais. Está num difícil jogo de equilíbrio entre o sms que envia, o charro que enrola, a cerveja que bebe e o cigarro que, em simultâneo, fuma.
Explica, olhando de soslaio por imperativos logísticos, que “a música é brutal, o tempo está maravilhoso e é tudo grátis”.
A multidão de cabeças pendulares cobre agora toda a rua e Dörg Melchow, actor de cinema, explica, por detrás de uns enormes e espelhados óculos de sol, que “a Fuck Parade surge para contestar a Love Parade, que não é mais do que uma puta vendida e comercial”.
Dörg arrisca que haverá três mil pessoas no desfile.
“É uma marcha em que as pessoas aproveitam para dizer ‘fuck’ às coisas que as irritam. Este ano protestamos contra o projecto de uma media city, que quer colonizar a opinião pública; contra a video-vigilância, que não pára de atropelar a nossa vida privada; e contra a vontade de alguns interesses imobiliários, que querem entupir Berlim de prédios e tirar-nos aqueles maravilhosos espaços à beira rio”, enumera.
A marcha das marchas todas – onde cabem também os gritos dos neo-nazis – vem dividida por carrinhas, que assinalam cada luta, munidas de colunas que rugem estrondosamente metal, techo, trance, que se digladiam e confundem.
“Mas é também a cena do ‘fuck’ tudo, ‘fuck, fuck, fuck’!”, termina.
Por ali abaixo, é ‘fuck’ que dizem todos: da matrafona que dança com um cabo comprido que tem na ponta uma câmara de videovigilância de cartão, até à gorda sado-masoquista que acorrenta o namorado, sem esquecer o mulato enorme e musculado que esvoaça em tronco nu, de calças de licra verde-alface e saia de tule rosa.
‘Fuck’ tudo, ‘fuck, fuck, fuck’ – à bruta ou com meiguice – ‘fuck’ tudo por ali abaixo.
Sem comentários:
Enviar um comentário