
[Fotografias: Vítor Martinho]
O Festival de Mascate acontece todos os anos entre Janeiro e Fevereiro e figura na lista dos mais famosos da capital. Chegam, arranjadas e perfumadas, pessoas de todo o país, prontas para «experimentar a verdadeira essência de Omã: as suas tradições, a sua cultura e modernidade, alcançada sem esmagar o traço do desenho da sociedade tradicional.»
O clima é de Feira Popular – pela diversão e pelo aperto da afluência, ávida de folia. Elas a concorrerem com os carroceis, transbordantes de brilho e maquilhagem; eles muito viris, com pose, barbas aparadas e desenhadas. Todos vestem roupas impecáveis e trazem os olhos muito abertos, atentos: hoje é dia de caça.
“Vimos aqui porque é onde podemos ver miúdas”, explica Khalid, 22 anos, cabelos farto e escuro, encaracolado, e sardas no nariz. É estudante de Engenharia Informática na Universidade Sultão Qaboos, a maior do país.
“Só comecei a falar com raparigas quando entrei para a Universidade”, continua. “Aliás, é a melhor coisa de tirar um curso superior: poder vê-las, estar com elas, ouvi-las, dizer-lhes coisas.”
São muito poucos os visitantes que não trazem os telemóveis na mão.
“As mulheres nunca vão ter com um homem”, diz. “Nós é que vamos ter com elas. Levamos na mão um papel pequenino, dobrado, com o nosso número de telefone. Não falamos, só sorrimos. Se ela estiver interessada liga. Se não estiver, já se sabe...”
Não será preciso ser um génio do

A tecnologia ajuda no galanteio: os telemóveis deles e delas têm o bluetooth ligado e ele faz, várias vezes, a vez do papel.
Khalid deixou em casa o seu traje tradicional: a disdasha (túnica) e o kimah (chapéu redondo, com bordados). Veste-se como se diverte: à imagem de um universitário europeu, mas sem álcool.
“Tenho amigos que bebem, mas isso é escolha de cada um. Eu não bebo. Fumo muito quando saio com os meus amigos: shisha, tabaco... Nem uso drogas. Tenho um amigo que foi apanhado a fumar droga e que vai cumprir 23 anos de prisão. Tem a minha idade.”
Khalid deve ter pouco mais de 1,70m. Tem formas redondas e um balanço extrovertido no corpo. Fala alto, entre gargalhadas, e percebe-se, pela frequência com que o seu telemóvel range e apita, que é sociável e muito popular.
É mais comedido quando fala em inglês. “A culpa é dos professores, que são todos indianos. Dizem wán em vez de one! Como é que conseguimos aprender a falar como deve ser?” Odeia indianos, assegura. E lamenta-se: “Tinha tanta coisa para vos dizer, mas com este inglês...!” E ri-se. E rimo-nos e agradecemos e lamentamos não entender árabe para conhecê-lo todo.
Vamos andando pela Feira e podíamos estar em Lisboa. Não há uma única nota de música árabe a sair das colunas enormes e potentes. As pessoas abanam-se – levemente, que é proibido dançar em público – ao som de música brasileira e latino-americana.

“Se ela responder vamos falando por sms e ao telefone durante um mês ou dois. Se a coisa for séria encontramo-nos depois disso para começar a namorar.”
Na rua não há beijos. Beija-se em casa ou no carro que, para efeitos pudicos e legais, é mais casa do que rua.
“O sexo antes do casamento é como o álcool, cada um sabe de si. A maioria não o faz. E casamos quando temos dinheiro. Precisamos de ter bastante dinheiro.”
Voltamos ao carro depois do espectáculo de pirotecnia e eu não contenho a curiosidade sobre o F. de prata, pendurado num fio que baloiça no retrovisor, ao ritmo da condução desastrosa de Khalid.
“Era da Fátima. Foi minha namorada até ter chegado um melhor partido, com mais dinheiro. E partiu-me o coração”, e aperta o F. com a mão direita, sentido. “Mas não quero falar sobre isso”, remata.
A música, a que ele sobe o volume para fazer parágrafo na conversa, em árabe, canta um amor perdido, que foi embora, ninguém sabe para onde.
Khalid lê mais uma mensagem no telemóvel e vira o retrovisor para nos ver melhor. Sorri. Tem um ar gingão e confiante. Volta a olhar para a estrada, satisfeito. Talvez fosse a miúda de há pouco. E se não resultar com esta, amanhã há feira outra vez.
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