A exposição “Novos Sonhos a Preto a Preto e Branco” inclui também seis pinturas sobre pedra mármore, mostradas apenas duas vezes em Portugal. Para a diretora do Centro de Arte Contemporânea, Ana Isabel Ribeiro, o conjunto das obras expostas “vai ao encontro de uma preocupação que sustenta todo o trabalho de autor, que é uma fusão entre a realidade e a ficção, um trabalho muito marcado pela força de agregação das pessoas”.
Nos desenhos, Malangatana visita o quarto do costume mas deixa a cor do lado de fora da porta: “Apesar de revermos erotismo nos traços do pintor, em desenhos que prosseguem a genealogia do seu léxico artístico e visual, a exuberância da cor ao serviço da forma, a que nos habituámos, não está presente”.
Ainda assim, acrescentou, estão lá os “traços lânguidos, de diferentes espessuras e intensidade, a dar corpo aos corpos e às figuras que se adensam e preenchem, quase sempre na totalidade, a folha onde se inscrevem”.
A diretora disse ainda que o erotismo destes traços é um olhar de fora para dentro: “Há algum paradoxo em alinhar estes desenhos pela temática do erotismo, porque ele aqui pode ser triste, abandonado. São corpos e rostos anónimos que convocam todos, na serenidade ou na impaciência dos seus sentimentos e inquietações”, afirmou.
As seis pedras mármore, alentejanas de Estremoz, têm um metro por um metro, e foram pintadas a lápis de cera. “Serão desenho ou não?”, questiona-se a diretora, lembrando que estas fazem parte de um conjunto maior, de 12 pedras, que foram mostradas apenas duas vezes em Portugal.
Esta é também uma exposição que espelha a dimensão de artista plural – Malangatana fez pintura, desenho, aguarela, gravura, cerâmica, tapeçaria, escultura, dança, música, poesia e teatro – e de homem com olhos e consciência na história e na política de Moçambique e do mundo.
Ana Isabel Ribeiro lembra que, “se o seu trabalho inicial não tinha uma relação direta com o homem, mas mais com a paisagem, cedo o artista convocou para as suas telas fábulas, histórias, rituais, contos tradicionais ou mesmo uma ambiência de religiosidade, que traduziam o seu apurado sentido de observação quer das suas origens culturais quer da situação colonial, vincando a crítica política e social”.
O corpo de Malangatana está em câmara ardente no Mosteiro dos Jerónimos, na Sala do Refeitório do Mosteiro, até às 24:00.